Criminoso pobre (selvagem) X criminoso rico (civilizado)

A figura do homem burguês, civilizado e culto, encontra seu ápice no século XVIII, no período iluminista pré e pós-revolução francesa, cujo estereotipo era de um ser humano educado, elegante, freqüentador da corte, apreciador das artes e das boas maneiras, poliglota e refinado no tratamento com seus semelhantes.

Segundo o professor Salo de Carvalho (Antimanual de Criminologia, 2008), esta imagem estereotipada do homem nobre e civilizado é baseada na cultura romântica apolínea, que sustenta o modelo metafísico de Sócrates, apresentando como valores fundamentais da humanidade: a Justiça, a Beleza, a Verdade e a Bondade.

Podemos afirmar, então, que o projeto político-filosófico da Modernidade, baseado na organização do Estado e tendo como fundamento as teorias do contrato social, tem como objetivo a busca da felicidade, através da implantação do ideal civilizatório, e a eliminação paulatina do “homem bárbaro”, e dos resquícios do selvagem, que representa o oposto do “homem civilizado”. Dito de outra forma, o homem bárbaro é o “outro” em relação ao homem civilizado, personificando a contradição dos valores morais socráticos: a Injustiça, a Feiúra, a Mentira e a Maldade.

Assim, o processo de desenvolvimento da cultura ocidental, baseada na lógica racional cartesiana, relegou a autoria dos atos brutais e criminosos somente ao homem selvagem (homo naturalis), aquele indivíduo que por retardo intelectual, moral e estético, ainda não atingiu o desenvolvimento próprio à segunda natureza humana, o homem civilizado (homo artificialis), e se apresenta como negação e até reforço do ideal civilizado.

Esta concepção de ideal civilizatório burguês (civilizado – beleza e bondade X bárbaro – feiúra e maldade) explica o surgimento da Criminologia Positivista em fins do século XIX, que tem em Cesare Lombroso seu grande mentor, que fundado na teoria evolucionista de Darwin, desenvolveu sua idéia do “delinqüente nato”, afirmando que todo o criminoso sofria de retrocesso atávico ao homem primitivo, e possuía caracteres físicos e mentais próprios.

Felizmente a idéia do criminoso nato foi repelida pela ciência criminal moderna, no entanto, o sistema penal continua a ser dirigido seletivamente contra a população pobre e estigmatizada (selvagens), privilegiando a camada rica (civilizados). Porém, as últimas notícias dando conta das prisões dos banqueiros Salvatore Cacciola e Daniel Dantas, do empresário Naji Nahas, e do ex-prefeito de São Paulo, Celso Pitta, nos dão esperança na aplicação igualitária da Lei, e nos revelam que criminosos não têm distinção de classe social, de cor, de beleza, de sexo, de nível escolar, etc.

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