De senectude, senilidade e demência senil – Sergio Agra

De senectude, senilidade e demência senil - Sergio AgraDizem que ofendo as pessoas. É um erro. Trato as pessoas como adultas. Critico-as e alguns acham que é ofensa. Crítica não é raiva. É crítica. Às vezes é estúpida. Cada qual que a julgue. E ninguém está ileso de cometer uma estupidez. Acho que quem ofende aos outros é o cronista em cima do muro, que não põe a cara à tapa, que não quer contestar coisa alguma. Meu tom às vezes é sarcástico. Pode ser desagradável. Mas é, insisto, uma forma de respeito, ou, até a irritação do amante rejeitado. É na escrita, meu emergencial e terapêutico divã, aonde me revelo, me dessangro e me disseco. Ao escrever desfaço-me intuitivamente da poluição, da sujidade associada ao mundano, dos miasmas, enfim.

Se me deleito em escrever e me permito o atrevimento de tornar público meus textos, DEVO respeitar, mais ainda, acatar como rezam APENAS NA TORIA algumas “defensoras” do regime democrático de direito todo e qualquer comentário manifestado por quem me lê. Jamais contestei a crítica (elogiosa ou de desmerecimento) às minhas convicções. Rebati, sim, os desavisados (poucos, muito poucos) que me atacaram na seara pessoal. Afinal, a ninguém imponho a leitura do que escrevo, como deduzo agirem de igual forma meus bons confrades de letras aqui no Litoralmania ou em outros veículos de comunicação.

Transgredir este parâmetro, como eufemisticamente sustentam alguns generosos camaradas afirmando ser “coisa de velhinha caduca”, de alguém mal amado ou de quem o tempo sepultou o aprendizado da História, é ser condescendente com quem se prevalece da circunstância de ser idoso.

Não! Não é “coisa de velhinha”, de provectos ou de mal amados. O “furo”, contrariando o dito, “é mais em cima”.

Acode-me a tese o Livro 1 da monumental obra de Platão, A República.

Sócrates é obrigado a pernoitar na casa de Polemarco e aí inicia seu diálogo com Céfalo. Em tom respeitoso, Sócrates pergunta sobre a velhice, ao qual Céfalo responde sobre as agruras da senectude e, citando Sófocles, indica que o mal não é a velhice em si. Ser velho ou jovem, tudo depende do caráter: Quando se possui boa índole e mente bem equilibrada, a própria velhice não é algo incompactável. Os que são diversamente constituídos, esses acham a mocidade tão tediosa quanto a velhice.

Tu vens raramente ao Pireu, Sócrates, para nos visitar. Devias vir mais vezes. Se eu fosse suficientemente forte para caminhar até a cidade, não precisarias vir aqui: nós nos dirigiríamos à tua casa. No entanto, és tu que tens a obrigação de vir cá mais amiúde. Pois, para mim, cada vez mais os prazeres do corpo cedem lugar ao desejo e ao deleite da conversação. Dá, então, a estes jovens o proveito da tua companhia e vem mais vezes a esta casa de teus muito íntimos amigos”.

“Agrada-me, Sócrates, expressar meu pensamento. Cultivo o hábito de encontrar-me com pessoas da mesma idade. Muitos de nós lamentam-se, recordam os prazeres da juventude e, ao lembrar do amor, da bebida, da boa comida e de outros prazeres, atormentam-se como pessoas privadas de bens notáveis, que em outra época viviam bem e que, agora, nem ao menos vivem. Vários manifestam pesar pelas ofensas oriundas dos parentes e imputam à velhice a causa de tantos sofrimentos. Contudo, em meu modo de ver, Sócrates, eles se enganam a respeito da verdadeira causa de suas misérias, pois, se ela fosse realmente a velhice, também eu sentiria o mesmo desconforto, assim como todos aqueles que chegaram a esta fase da vida. Mas a verdade é que tenho encontrado velhos que se expressam de maneira muito diferente”.

Alternativamente à face positivista emprestada porCéfaloa senectude para muitos não está imune aos efeitos da senilidade ou da demência senil, que podemser consideradas como um conjunto de condições médicas e doenças que afetam a saúde cognitiva de uma pessoa.

Entre os sintomas típicos dessa condição são observadas as dificuldades de comunicação, a perda de memória, mudança de personalidade e dificuldade para formular pensamentos fundamentados.

De outra banda, o termo senilidade é comumente utilizado para descrever algum tipo de declínio na saúde de um idoso, tanto física como cognitiva.Assim como a demência, a senilidade pode provocar alterações na saúde mental, como perda de memória.Na senilidade é possível perceber mudanças estruturais e funcionais no comportamento e na maneira de interagir da pessoa, tornando-a, neste último quesito, intransigente, raivosa e, como dita a moda, “fora da casinha”.

Fosse Céfalo e tantos outros homens e mulheres idosos portadores de demência senil sem parentela ou de pessoas que os acudam e lhes devotem afetos, como Polemarco, Lísias e Eutidemo, filhos de Céfalo, possivelmente espelhariam Dom Quixote, o cavaleiro da triste figura, lutando, se entreverando e esbravejando contra as pás de um moinho de ventos que apenas eles veem. São pessoas dignas da compaixão de seus contemporâneos.

Ou da provocação de seus implacáveis leitores.

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