O abraço do meu sofá, uma crônica dentro de uma crônica – Silma Terra

O abraço do meu sofá, uma crônica dentro de uma crônica - Silma Terra

COLUNA COTIDIANO

O abraço do meu sofá, uma crônica dentro de uma crônica.

Passar dias e dias olhando a vida passar lá fora, impossibilitada de sair à rua, para mim não é nenhuma novidade. O motivo era outro, mas igualmente dolorido. Nestes dias, sentada na poltrona preferida em frente à janela panorâmica do meu apartamento, lembrei então, de uma crônica feita referindo-se àquela época em que mudei o sofá de lugar. Antes encostado à parede da janela, mudei e coloquei em frente, assim,  possibilitou-me que, naqueles dias frios de inverno eu assistisse como de uma tela de TV a vida passar. Como as coisas se repetem, por mais que jamais coloquemos o pé na mesma água, do mesmo rio, as situações se repetem como um Déjá-vu.

Hoje a situação parece a mesma, da minha janela panorâmica, vejo o bailar de arvores ao vento, o vai e vem das pessoas em seus carros ou a pé, transitando pelo condomínio. Aos meus ouvidos chegam os sons de seres humanos barulhentos.

De fato, a história se repete, mas as nossas posições não são as mesmas.

A vida não é uma verdade pronta e acabada.

Não coloque as costas do sofá na parede da janela, coloque em frente, deite-se ou sente-se, afaste as cortinas e olhe para a rua, veja o mundo passar. Eu fazia muito isso quando do tratamento do câncer no ano de 2006. Sentada no sofá da sala eu observava o mundo passando lá fora. Olhava a grama do vizinho tão mais verde do que a minha, o observava a cuidar de sua horta cheia de legumes e verduras.

Um raio de sol se desenhava, invadindo o espaço, iluminando o que parecia ser escuro, só parecia… dali eu via a mulher com o filho pela mão, passos lentos a acompanhar o passinho da criança, feliz e radiante sonhando com o futuro de seu rebento.

Aconchegava-me mais para o lado direito do sofá, puxava o travesseiro e o cobertor e ficava a admirar a montanha verde que emoldura minha cidade. O leve sacudir da cortina de voal,  trazia uma brisa ao meu rosto. Ao refinar os ouvidos, escuto o cantar de pássaros e ao apurar o olhar, uma asa delta corta o ar num bailado suave como os passos de uma valsa bem dançada.

Passam os carros, dentro deles homens e mulheres trilhando seu “lavoro”. Ouço o latido de um cão, vibrando com a chegada do seu dono… cães teimosos em sua lealdade e fidelidade.

À minha volta algumas revistas direcionadas ao público feminino. Olho a modelo da capa, pele perfeita, dentes perfeitos, corpo perfeito, tudo perfeito num mundo nada perfeito. Passos as páginas e vejo um mundo que não conheço, de festas luxuosas, vestidos maravilhosos, iates, lugares paradisíacos e para poucos, quase um mundo surreal, de pura exaltação de celebridades.

Tudo lá fora parecia andar mais rápido, ou eu que estava num slow motion?

Meu sofá companheiro de tardes de sol, de sonos furtivos parecia me abraçar.

No meu sofá, anônima; como a vida alheia parecia ser mais interessante do que a minha.  Eu não tinha nada para fazer, só uma grande preocupação: viver.

Assim repetimos inúmeras vezes situações e não nos damos conta. Ao vivenciar essas situações, vamos pra cá, pra lá e não paramos para refletir, com medo de olhar para dentro de nós.

Penso no silêncio e na solidão que vivo os dias e que para mim são fontes de criatividade. Albert Eistein disse, “que a monotonia e a solidão de uma vida tranquila é o que impulsiona a mente criativa.”  Concordo. Quem sou eu para discordar dele? Mas é disso que eu, escritores e artistas gostamos, do silêncio para expressarmos o que vibra em nossas mentes. É entrar num mundo interior tamanho que beira a uma paz e aconchego e que nos traz quase um delírio.

Sou meio antagônica, amo estar em silêncio em pleno processo criativo, mas busco também sempre experimentar novas sensações. Apenas vemos o mundo de uma forma diferente. Na solitude gosto de me conectar com a solidão e é neste cenário autêntico que está o caminho para o autoconhecimento. Nesse processo sigo meu caminho, ciente que o silêncio é o pai das melhores resoluções.

Olhar pela janela, por este limiar, o mundo se abre em busca de novas possibilidades; transcender o vidro e olhar para tudo e para o nada ao mesmo tempo; os sons, as formas, a luzes, as cores. Quem observa uma pessoa, em frente a uma janela pode remeter à tristeza, introspecção, depressão, mas não, pelo menos para mim a janela é um portal que me leva à imaginação, aos sonhos, ao bem-estar, leva-me a divagar e nos meus devaneios, sinto o entusiasmo, de onde vem sugestões de inúmeras histórias.

Meu sofá companheiro de tardes de sol, de sonos furtivos, abraça-me diariamente nestes tempos de confinamento. Eu anônima, continuo em busca de autoconhecimento, mas numa versão melhorada. A sinergia entre equilíbrio e paz é maravilhosa. Sinto-me à pleno em minha sanidade mental, e sonho acordada. Experimente isso. Pare, mesmo que você não precise, pare e olhe para uma janela, o que se descortina à sua frente, veja minúcias, seja como um detetive em busca de pistas, atenha-se aos detalhes. Sonhe acordado, busque, sempre há infinitas possibilidades.

Continuo sem ter nada para fazer, minha única preocupação é viver.

Lembrei agora de Lulu Santos, da canção, Apenas mais uma Canção de Amor.

O que escrevo, “não tem a menor pretensão de convencer… não tem a menor obrigação de acontecer”.

#teatirapravida

Silma Terra

Palestrante Motivacional, comunicadora de rádio e televisão, Youtuber e Bibliotecária de formação.

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